terça-feira, março 20, 2007

Geller -guru e cabelereiro de Elvis - segunda parte

LARRY GELLER - por Piers Beagley
Obviamente, devem ter havido alguns momentos de tensão entre você e os outros elementos da Máfia de Memphis por causa de seus modos diferentes de vida.
Acertou em cheio, foi mesmo assim! Bem, o que tenho de dizer é que eu estava lá porque era o que eu fazia para viver, mas, mais importante que isso, estava lá por causa de Elvis, porque gostava dele. Ali estava um cara super aberto e receptivo, interessado naquilo que eu tinha para dizer, por isso, era a combinação perfeita. Ambos gostávamos muito de numerologia e ele era um 8 porque nasceu em 8 de Janeiro e esse é um número que representa ser mal entendido. E Elvis sentia que era muito mal entendido. Falta de entendimento na sua carreira e até com as pessoas sobre quem ele era. Elvis tinha perfeita consciência de todos os ciúmes, invejas e ressentimentos dentro do grupo, mas ele achava que estávamos ali para um objetivo mais importante. Era nisso que se baseava a nossa amizade, mas era muito difícil. Para o mundo exterior eu fazia parte da Máfia de Memphis, mas dentro do grupo havia alguns elementos que se detestavam entre si – e isso existe ainda hoje. Eu tinha a atenção de Elvis e eles não gostavam disso. Não sabiam do que falamos ao longo dos anos. Em termos da visão que Elvis tinha para o seu futuro, as pessoas à volta dele não sabiam nada de nada, exceto Charlie Hodge. Charlie sabia porque ele era muito discreto em relação a algumas discussões muito, muito importantes que tiveram lugar durante os últimos dois anos de vida de Elvis. Depois de um concerto, os rapazes iam até ao bar para se encontrar com garotas e eu ia para ficar com Elvis. Era por isso que estava lá e era por isso que queria estar lá.
Charlie parecia ser um dos melhores amigos de Elvis.
Charlie era um homem muito simpático e decente e o Billy também esteve sempre presente. Sempre senti que tinha uma missão, por isso sentia que tinha de ficar com Elvis durante os piores momentos. Até hoje em dia, mesmo com aqueles que ainda me guardam ressentimentos e com quem não me dava, não me importo com isso. Porque nós estabelecemos um elo e partilhamos algo de tão único e profundo que tudo o resto consegue passar-me ao lado. O que eu não faria para poder estar sentado durante dez minutos com ele agora mesmo!
Houve um longo período em que você não teve qualquer contato com Elvis, desde 1967 a 1972, depois do incidente durante as filmagens de Clambake. Lembro-me que você disse que voltou a vê-lo novamente em Agosto de 1972 e que lhe pareceu que já nessa época ele estava metido em sérios problemas.
Foi o meu amigo Johnny Rivers que sugeriu que fôssemos ver Elvis em Las Vegas. Mas quando Elvis apareceu, pude ver a mudança e vi isso nos seus olhos. E acontece que disse a alguém que estava na nossa mesa, “Ele tem mais cinco anos de vida, da forma como está a ir.” Claro que não estava mesmo a falar a sério, mas foi apenas porque pude sentir que algo estava errado. Conseguimos ver pela linguagem corporal de alguém e pude sentir que ele estava a usar más substâncias e que provavelmente não tinha os elementos certos à sua volta. Era algo que tinha a ver com a energia.
Muito embora o Coronel tenha, de fato, feito alguns negócios espantosos nos primeiros tempos, parece que por volta dos anos 70 ele estava fazendo o seu “cavalo de corrida correr até à morte”. Isto deve ter sido horrível de ver, não?
(suspirando) Oh, meu Deus, em algumas noites nem sei como ele era capaz de atuar. Numa das últimas turnês de Elvis, estávamos em Louisville, no Kentucky, e Elvis estava fisicamente doente e estava passando por problemas emocionais sérios. Nesta noite em particular sentia-se com náuseas e com febre, sentia-se terrivelmente mal. Não conseguia dormir, virava-se e revirava-se na cama. Eu mesmo estava tão cansado, que disse, “Ei, Elvis, tenho que ir dormir um pouco. Te vejo depois quando acordar.” Estávamos no Hilton Hotel e no dia seguinte, quando regressei à suíte de Elvis, entrei e, surpreendentemente o Coronel estava lá. Foi a primeira vez que o vi dentro do quarto de Elvis. Disse, “Olá, Coronel”. E ele disse, “Onde é que ele está?” Expliquei que estava com o Dr. Nick e disse, “Deixe-me ir dizer ao Elvis que está aqui.” O Coronel passou por mim à pressa e disse, “Não. Eu é que vou entrar” e abriu a porta.
Até me dói dizer-lhe isto, mas o que eu vi foi o Dr. Nick ajoelhado à cama de Elvis. Elvis estava desmaiado e o Dr. Nick colocando a cabeça de Elvis dentro de um balde com água gelada para o reanimar. Era uma visão patética. A porta fechou-se e o meu primeiro pensamento foi, “Provalvemente isto é bom, pois finalmente o Coronel vai ver o que raio se está se passando. O Velhote vai ver que Elvis está numa péssima forma, está semi-consciente e tem de parar esta turnê horrível.” Um minuto depois a porta abriu, o Coronel passa outra vez por mim e eu levanto-me. Ficamos parados frente a frente e ele a olhar-me fixamente nos olhos. Ele disse, “Vê se me ouves muito bem. A única coisa que é importante é que aquele homem esteja sobre o palco esta noite! Ouviste bem? Mais nada interessa.” E foi-se embora.
O meu coração afundou-se. Eu sabia a verdade e só me apetecia gritar. Oh, meu Deus, que filho-da-**** desgraçado. E depois ouvi Elvis gritar, “Lawrence, é você que está aí? Porque diabo deixou aquele sacana entrar aqui?” Expliquei-lhe que ele tinha passado por mim e depois Elvis ficou xingando o Coronel Parker durante uma hora. Usou todas as palavras más que existem e disse, “Aquele sacana gordo, filho-da-****… Vou ver se me livro daquele filho da mãe. O pai quer livrar-se dele; há anos que o odeia. Não consigo suportá-lo. Há anos que ele perdeu o sentido total do que é o show business. Está apenas me usando e quero que Tom Hullett seja o meu empresário. Depois da turnê de Setembro, acabou-se!” Falou sobre quem ia despedir e como ia mudar as coisas de uma vez por todas.
E o que tem a dizer do boato que Joe trabalhava para o Coronel e para Elvis?
Elvis parecia ter conhecimento disso e ressentia-se disso. Sinto-me pouco à vontade a dar pormenores, pois isso não seria nada simpático, mas há muito mais sobre isso no novo livro sobre o Coronel. No entanto, posso mencionar um tipo de história relevante que está no meu livro If I Can Dream. Um dia estávamos em Chicago e eu fui até ao quarto de um dos rapazes e disse, “Sinto-me assustado como se alguma coisa estivesse errada. Se olhar bem para Elvis, pode ver que ele está tão doente, mais do que doente e precisamos fazer alguma coisa, pois tenho medo de que aconteça alguma coisa.” Ele disse, “Espera um pouco. Larry, está sendo negativo. Daqui a 20 anos Elvis ainda estará tão saudável como está hoje. Todos nós sabemos que os cantores rejuvenescem. Mas te digo, Larry, que vai acontecer é uma coisa a ti. E sabe porquê? Porque está a ser tão negativo!” Percebi que estava falando uma língua estrangeira com alguém, com comprimidos no seu sistema, que não conseguia ver a realidade e que estava em total negação. Mais tarde fui falar com outros dois, mas de forma semelhante, disseram que eu estava ficando paranóico. Sem saber muito bem o que fazer, fui falar diretamente com Elvis. E contei-lhe a verdade e que estava preocupado. Contei-lhe à frente do Joe Esposito e do Dr. Nick.
Também deve ter estado presente quando começaram a surgir boatos sobre o livro Elvis: What Happened?.
Quando Elvis ouviu falar sobre esse livro e que os 3 homens iam “chutar o balde”, isso o afetou muito. Sentiu-se como se o estivessem esfaqueando. Ele dizia: “Se aqueles caras precisavam de dinheiro, eu daria tudo o que queriam. Só que já não os quero à minha volta. Já tive processos legais em cima de mim que me custaram 10 milhões de dólares por causa deles.” Passaram-se dois ou três meses e nunca mais ninguém ouviu falar do livro. Elvis pensou que talvez o Coronel tivesse conseguido fazer parar o processo. Disse-me que pensava que afinal já não seria mais publicado. No entanto, um dia, durante uma turnê, um fã que tinha trabalhado na editora de Nova Iorque, me forneceu uma cópia manuscrita. Voltei para o meu quarto e pensei, “Oh, merda, eles vão acabar com Elvis.”
Grande parte do livro era exagerado e havia meias verdades. Então senti que precisava de esperar pelo momento certo para contar a Elvis, pois agora sentia que a pressão estava em cima de mim. Duas semanas depois, ainda em turnê, estava no quarto com Elvis e ele estava a queixar-se que doía a garganta e que lhe doíam os ossos. Sentia que alguma coisa estava errada e foi aqui que ele mencionou um possível câncer. Disse-lhe que ele precisava de dormir bastante e recarregar as suas baterias, visto que estaria no palco mais uma vez naquela noite. Deixei-o ficar sozinho e fui para o meu quarto.
Uma hora e meia depois o meu telefone toca, “Lawrence, volte aqui, por favor. Não consigo dormir, pede ao Dr. Nick para vir.” O Dr. Nick chegou e deu a Elvis um monte de comprimidos. Regressei ao meu quarto e deixei-o dormir. Naquela tarde, às 16h00 voltei ao quarto de Elvis para o acordar e bati suavemente na porta. Elvis disse, “Entra, Lawrence,” e estava sentado na cama. Estava a abanar a cabeça e disse, “Não consigo, caramba.” Nesta momento, Joe entrou. Elvis disse, “Escutem, rapazes, estou doente. Tenho de cancelar a turnê. Vou telefonar ao pai e vocês regressem aqui daqui a 5 minutos.”
Me dei conta que se Elvis cancelasse a turnê naquele momento, isso só iria acrescentar mais lenha à fogueira do livro que eu sabia que seria publicado.
Então foi nesse momento que percebeu que tinha que contar a Elvis sobre o livro?
Exatamente. Com o Dr. Nick e o Joe presentes, contei tudo a Elvis no seu quarto naquele dia. Disse, “Elvis, tenho que te dizer uma coisa. Ninguém à sua volta te conta a verdade, mas sabe aquele livro? Vai sair, já vi as provas.” Elvis ficou branco. Eu disse, “Se está doente e quer cancelar esta turnê, tido bem. Mas os rapazes estão prontos para te crucificar e tens de saber o que se passa. Vão dizer coisas que não vai gostar de ouvir, mas tem de estar informado.”
Elvis estava de pé, mas sentou-se na cama, com o seu macacão e disse, “Telefona já ao Coronel”. Deitou na cama, e cruzou os braços. Neste momento entra o Charlie Hodge, todo divertido e pronto para ir para o palco. Elvis bronqueou: “Fecha a matraca, Charlie.” Agora, tanto Joe como todos nós estamos sentados na cama de Elvis quando Tom Hullett entrou e perguntou o que estava acontecendo.
Elvis disse: “Não sou capaz. Estou doente, caramba. Detesto ter que fazer isto, detesto ter que cancelar a turnê, mas não sou capaz.” Tom Hullet disse o mesmo que eu. “Se tem que fazer, tudo bem, mas isso vai chegar a imprensa. Por isso, por motivos de segurança, temos que te levar a um hospital e depois para casa.” Elvis me fez um sinal para ir até o banheiro com ele, levantou os braços e olhou para mim. Disse, “Olha para mim, Larry, olha para mim, homem. Estou tremendo, estou doente” e estava a chorar. Comecei a chorar e disse, “Sei que está doente, mas tive que dizer. Desculpa. Foi este o momento em que tive que contar. A tua vida está em jogo.”
Durante as duas horas seguintes estivemos arrumando as malas e a preparando-nos para ir embora. Não lhe arrumei o cabelo como costumava fazer e ele esteve muito calado comigo e não disse nada. Regressamos de avião a Memphis onde esperavam que fôssemos diretamente para o hospital, mas em vez disso fomos para Graceland. Já aí Elvis come uma torta enorme e acaba ficando no seu quarto até às 18h00 e só depois é que vai para o hospital. Senti que não podia regressar a LA até falar com ele, por isso fui até ao hospital, onde os rapazes me informaram que ele não me queria ver. Lembro-me de ver Lamar saindo do quarto de Elvis e de me dizer, “Contaste-lhe a verdade, não foi? Caramba, deixa-me apertar sua mão. É o único daqui que tem coragem!”
Continuava a precisar de ver Elvis, por isso esperei durante dias num quarto próximo ao seu. Não era capaz de ir embora. Numa manhã ouvi Elvis dizer, “Lawrence, está aí?” Entrei no seu quarto e Elvis disse, “Larry, tens de me perdoar, irmão. Foi o meu ego. Está aqui porque me disse a verdade. É por isso que está aqui. Tem que entender pelo que estou passando.”
No seu livro você menciona que até mesmo nestas condições, Elvis ainda estava fazendo planos para o futuro. Pelo menos isso soava positivo.
Elvis tinha mesmo planos para o futuro, que envolviam um livro e projetos como ator. A turnê seguinte foi duas semanas depois. Estávamos em Detroit e era 25 de Abril porque estávamos a falar da mãe dele e essa era a data do aniversário dela. Elvis levantou-se, estávamos a olhar um para o outro e ele pousou sua mão sobre meu ombro. Com a outra mão apontou lá para fora e disse, “Os fãs conhecem o ‘Elvis’ muito bem.” Mas depois bateu com um dedo no seu peito com bastante força e disse, “Mas, caramba, não me conhecem a mim. Não fazem idéia nenhuma.” E disse, “Lawrence, está comigo?”
Perguntei o que ele queria dizer com aquilo e respondeu, “Escuta, Larry, senão contar a verdade ao mundo eles nunca hão de saber a minha verdadeira história. Você me conhece e não pediria isto a mais ninguém. É responsável, pois foi você que me colocou neste caminho. Sei o que leio, sei o que estou passando. Sabe o que estou tentando fazer, em como gostava de ajudar este mundo. É justo fazermos algo juntos, Larry. Talvez escrevamos um livro. Podíamos intitulá-lo Through My Eyes (Através dos meus Olhos) e fazermos filmes com sentido.” Tudo isto soava tão bem, que concordei e disse, “Claro, Elvis. Estou contigo e podemos fazê-lo.”
Durante os anos 60 Elvis xingou e queixou-se sobre os seus filmes muitas, muitas vezes e como queria sair daquilo. Dizia, “Olha, não estou metido nisto só pelo dinheiro. Sempre quis ser ator.” Aquilo que mais lamentava era nunca ter ganho um prêmio da Academia. Já tinha trabalhado com ele no documentário de 1974 sobre as Artes Marciais. Então falávamos sobre outras idéias acerca de filmes que Elvis gostava, conseguirmos arranjar alguns dos melhores roteiristas de Hollywood para trabalhar num filme feito por encomenda para ele. Era este o objetivo e até chegamos a falar em tirar um ano de folga, ir para o Hawaii para a pré-produção, mas, claro, isso nunca aconteceu.
Mas para fazer isso ele teria de escapar do Coronel que, claro, ele tentou fazer em 1973, mas não conseguiu.
É verdade! Nessa época Elvis cedeu, mas por volta de 1977 ele sabia que as coisas tinham de mudar. Queria livrar-se do Coronel e queria uma nova mudança. Falou em voltar a casar e ter mais filhos. Ele queria isso. Era uma luta constante.
Em Março de 1977, você chegou a ir naquelas últimas férias no Hawaii. Obviamente que na época Elvis andava variando de regimes que iam de vitaminas naturais, que você sugeria, e todos os medicamentos químicos que tomava dados pelo Dr. Nick.
Não tenho respeito pelo Dr. Nick. Antes de uma turnê começar, eu arranjava pacotes de vitaminas e minerais para me ajudar a manter-me saudável durante a turnê. Além disso, eu era vegetariano. Um dia eu estava no quarto de Elvis quando ele acordou e o Dr. Nick estava lá. Peguei num pacotinho de vitaminas, coloquei na mesa e disse, “Elvis, devia tomar isto, são bons para ti.” Também lhe fiz um discurso sobre os benefícios das vitaminas. E o Dr. Nick disse, “Ei, tira essa porcaria daqui. Essa merda não funciona.” Era um médico que dizia isto! Claro, já nem sequer é medico. Graças a Deus que se fez alguma justiça.
De fato, não foi em 1967 que deixou Elvis pela primeira vez e foi o exato momento em que o Dr. Nick apareceu pela primeira vez?
Sim e foi quando Elvis iniciou o seu regime de tomada de comprimidos.
Algumas pessoas dizem que o lado místico e espiritual de Elvis não era importante, mas durante os anos 60 deve ter sido algo de bastante importante, pois Elvis estava fazendo filmes leves e horríveis e durante esse tempo deve ter andado à procura de algo.
Elvis surgiu da sua base espiritual, pois ele era assim. A coisa mais importante na sua vida era a sua carreira, a sua filha e a sua alma espiritual. Trinta minutos antes do funeral de Elvis, Vernon revelou-me algo que disse tudo. Estávamos em Graceland no quarto da empregada e vi Vernon sentado e com um aspecto cansado. Fez-me sinal para me aproximar e disse, “Larry, tenho de desabafar uma coisa contigo. Quando apareceste pela primeira vez, desconfiei de você. Era ‘você e Elvis’ a toda a hora e você trazendo todos aqueles livros esquisitos. Cheguei mesmo a falar com Elvis e dizer-lhe o que achava, mas ele disse, ‘Não se preocupe, Larry é uma ótima pessoa.’ Levei muito tempo, muitos anos, para perceber isso, Larry, que você e Elvis eram apenas pessoas espirituais.” A casa estava cheia de gente e Elvis estava ali deitado dentro do seu caixão e quando Vernon me disse isto, foi como se me tivesse caído uma tonelada de tijolos em cima de mim.